Aquela tarde fria em meados do mês de maio não intimidou o grupo de mães que se aglomerava na Câmara de Vereadores de Pelotas. Vento e chuva seriam obstáculos para qualquer outra manifestação, mas não para as Mães contra o Crack. Enfrentando todas as adversidades, elas arrancaram em uma caminhada silenciosa que emocionou e chocou o município da região sul do estado.
A luta das mulheres de Pelotas começou em outubro do ano passado, com a criação do grupo Mães contra o Crack pela presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Vereadores de Pelotas, vereadora Miriam Marroni (PT). Os encontros que começaram com 25 mulheres, saltaram para 50 mães em pouco mais de 30 dias.
“O crescimento no número de mães em tão pouco tempo reflete a epidemia desta maldita pedra que assola a nossa cidade, a região e o país. Era preciso criar alternativas para lutar ao lado dessas mães sofridas que jamais pensaram em abandonar seus filhos dependentes”, conta a vereadora petista.
Os primeiros encontros das mulheres aconteciam no plenário da Câmara Municipal de Pelotas. Era o momento de cada uma delas conhecer a história da companheira sentada ao lado. Muitas se assemelhavam. Não obstante, a emoção era o tom das reuniões. Foi nestes primeiros passos que se definiu a bandeira de luta das Mães contra o Crack.
“Rapidamente identificamos que era necessário lutar por tratamento. Evidentemente, é preciso criar políticas públicas para a prevenção ao consumo de drogas. Mas tendo em vista o grande número de usuários de Crack e com os dados em plena ascendência, fez-se necessário buscar junto ao Poder Público alternativas de tratamento para os dependentes”, disse a parlamentar.
O grupo Mães contra o Crack em sete meses de existência já teve momentos bem distintos, com ações bem definidas. Já foram ao Ministério Público e lançaram camiseta, por exemplo. Todo o esforço das mulheres chamou atenção da sociedade. Porém, nada supera o drama vivido no espaço domiciliar de cada uma das integrantes.
“O Crack e os traficantes estão levando nossos filhos”, narrou emocionada uma das mães.
Uma das mães, de 60 anos, que pede para não ter sua identidade revelada, expõe o drama que vive há quatro anos. Dos quatro filhos homens, dois estão no calvário da pedra.
“É uma situação inimaginável. Dois estão perdidos no Crack. É muito complicado. A mãe sofre, a família toda sofre. Precisamos de ajuda”, relata a mulher.
No último dia das mães o grupo Mães contra o Crack foi presenteado pela vereadora Miriam Marroni, com a Tenda da Autoestima, atividade realizada pela parlamentar há dez anos. No calçadão de Pelotas, cabeleireiros, maquiadores e música ao vivo embalaram em uma tarde de sol a autoconfiança dessas guerreiras pelotenses.
Inspiração Argentina
A inspiração das mulheres pelotenses foi buscada no país vizinho, a Argentina. Mais precisamente, nas Mães da Praça de Maio. Essa praça é a principal da cidade de Buenos Aires, onde se localiza a Catedral Metropolitana, o edifício do governo do município e a Casa Rosada, onde reside o poder executivo argentino. Desde a década de 1970 as Mães da Praça de Maio se reúnem com fotos dos filhos desaparecidos políticos durante o regime militar argentino.
Foi com o sentimento de quem quer salvar os filhos e os filhos de outras mães que as Mães contra o Crack realizaram a manifestação que você leu no início da reportagem. A caminhada aconteceu da Câmara de Vereadores, passando pelo Calçadão e finalizando o protesto silencioso em frente à Prefeitura Municipal. O único “grito” das mulheres estava descrito nos cartazes: “Nossos filhos precisam de ajuda. De tratamento”.
“Essas mulheres são guerreiras. Lutam sem desistir dos filhos, que infelizmente se envolveram com essa droga. O crack destrói. E somente com a união de todas mulheres, do Grupo Mães contra o Crack, assim como as Mães da Praça de Maio, conseguiremos vencer a guerra”, finalizou a vereadora Miriam Marroni.