No último domingo, a Zero Hora publicou reportagem sobre a distância do vício, intitulada: um salto sobre o crack. Nela é mostrado a história de quatro dependentes químicos que já estiveram nas páginas do jornal. Procurados novamente, esses jovens contam como batalham todos os dias para se manter em abstinência. Família, trabalho, religião e disciplina fortalecem o período longe da droga e permite reaver a esperança perdida.
Campeão de hipismo: o cavaleiro gaúcho Rodrigo Garcia Bass, 31 anos, campeão vitorioso em competições de hipismo, era habituado a superar obstáculos até encontrar diante de si uma pedra de crack. Durante dois anos, sua carreira e seu patrimônio definharam devido à dependência química. Agora ele se apronta para dar uma demonstração pública de que a droga não é uma barreira intransponível. Afastado da pedra, no próximo domingo, o cavaleiro comapeão vai voltar a competir. O caso dele é emblemático porque ele se firmou como uma das principais estrelas do hipismo gaúcho ao se sagar uma vez campeão nacional, outra vice-campeão e conquistar três títulos regionais.
Estacionamento: empregado há um mês em um estacionamento no Centro da Capital, Rodrigo de Souza Barros, 34 anos, comemora uma atribuição corriqueira da nova rotina como se fosse um prêmio. Ele deu alta há seis meses. Ele é ex-garçom, não poderia voltar a trabalhar com isso por ficar perto da bebida. Desde os 15 anos consumia álcool, maconha e cocaína... até se afundar no crack. Até setembro do ano passado estagiou na Pastroral de Auxílio ao Toxicômano, administradora da fazenda onde ele se trataou. A família toda precisa ser tratada e continua frequentando os encontros (o filho, pais e irmãos).
A RECUPERAÇÃO (DICAS!!!)
Tratamento costumam passar por três estágios
DESINTOXICAÇÃO: é a fase incial do processo de recuperação! Conforme a gravidade do caso, pode exigir a internação do usuário para para suportar as primeiras semanas de abstinência. Se houver necessidade, podem ser ministrados medicamentos como antipsicóticos, moduladores de humor, ansiolíticos ou antidepressivos. Duração: pode se estender de dias até alguns meses.
TRATAMENTO INTENSIVO: mesmo após a internação, o paciente permanece sob cuidado frequente, mais de uma vez por semana. O atendimento deve ser multidisciplinar, envolvendo psicoterapia, participação em grupos de apoio, terapia familiar, oficinas ou retorno ao trabalho, preferencialmente com apoio de amigos e familiares. Deve-se manter, ainda, monitoramento médico. Duração: geralmente, se não há recaídas, de seis meses a um ano
TRATAMENTO DE LONGO PRAZO: dependerá dos sintomas. Se não houver recaídas, pode-se reduzir a frequencia de atendimentos - mas recomenda-se manter a psicoterapia ou grupos e consultas com um médico periodicamente. O dependente deve manter uma rotina saudável e vínculos sociais. Duração: vários anos.
Considerada em passado recente droga das populações menos favorecidas, o perfil do usuário vem mudando a cada ano, atingindo todas as classes sociais. Segundo dados da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, entre 2006 e 2008, o número de usuários de crack com renda familiar acima de 10 000 reais aumentou 139,5%. Em algumas das mais caras clínicas particulares de tratamento de dependências químicas em São Paulo, cerca de 60% das internações são de usuários de crack.
Segundo dados da Junta Internacional de Fiscalização a Entorpecentes (Jife) — órgão ligado à Organização das Nações Unidas (ONU) — o Brasil ocupa o terceiro lugar no ranking de maior consumidor mundial dessa droga e tem a principal rota de tráfico internacional de cocaína no Cone Sul.
O vício em crack tornou-se um caso de saúde pública que está beirando níveis epidêmicos e é um enorme desafio para as autoridades brasileiras. Em maio passado, o governo federal lançou um plano de tratamento e combate à droga, que é mais uma releitura do programa anunciado em junho do ano passado, que não foi implementado. A meta do governo desta vez é investir 410 milhões de reais e dobrar de 2 500 para 5 000 o número de leitos para dependentes químicos no Sistema Único de Saúde (SUS), criar abrigos e centros para apoiar usuários e capacitar professores da rede pública para lidar com os jovens dependentes.
Se o governo conseguir implantar o que promete já será um avanço. Pequeno, mas insuficiente. Cientistas vêm pesquisando formas inovadoras de tratamento, porém, não há informações de que o sistema público de saúde esteja adotando esses novos tratamentos. Embora o assunto já esteja sendo abordado na Câmara e no Senado, que aumentou para 100 milhões de reais a verba destinada ao tratamento de dependentes de crack, ainda é muito tímida a iniciativa no âmbito de políticas públicas. Deve haver incentivo para a produção de pesquisas inovadoras nos tratamentos; apoio às universidades para implementação de centros de referência; garantia de apoio multidisciplinar como psicológico e assistência social para usuários e familiares; entre outras iniciativas.
É importante se avaliar o aspecto social nos tratamentos, visto que o crack, por ser ilícito, é distribuído em um cenário de marginalidade e violência. Para conseguir saciar o vício, o usuário perde a noção do perigo e envolve-se constantemente em situações de alto risco. Segundo dados da Universidade Federal de São Paulo – Unifesp –, a mortalidade associada ao crack é de 30%, sendo que metade das vítimas morre em confrontos violentos com traficantes ou policiais, e isso deve ser levado em conta na hora de planejar o tratamento adequado para cada usuário.
O avanço da droga na infância, segundo um levantamento da Secretaria de Saúde de São Paulo, mostra que, em dois anos, dobrou o número de crianças e adolescentes em tratamento contra a dependência de crack. Há casos de crianças com 10 ou 11 anos, viciadas na droga, o que está levando a outro grave problema: mães desesperadas estão prendendo seus filhos com cadeado e corrente para afastá-los do crack.
A cura é possível, como demonstram vários relatos de ex-usuários publicados nos veículos de comunicação, mas não é fácil e pode levar anos. Ainda há o risco de recaída. Segundo grupos de ajuda como os Narcóticos anônimos, deve haver controle a vida inteira. A família tem papel fundamental na recuperação e manutenção da saúde de ex-dependentes e podem ajudar a exercer esse controle com equilíbrio.
Artigo publicado na revista Carta Capital